Uma
das questões mais cruciais e frequentemente mal compreendidas na teologia
cristã é a relação do crente com a lei de Deus. Muitos, em um esforço para
exaltar a graça, acabam por relegar a lei a uma relíquia histórica, um código
obsoleto que não mais se aplica àqueles que estão em Cristo. No entanto, uma
análise cuidadosa das Escrituras, alicerçada na sabedoria da tradição
reformada, revela uma verdade muito mais profunda e consistente: enquanto os
aspectos cerimoniais e civis da lei mosaica foram cumpridos e revogados em
Cristo, a lei moral de Deus, como uma expressão direta de Seu caráter santo e
imutável, nunca passou e permanece em plena validade como o padrão de conduta
para o povo de Deus na era da graça. Longe de ser um fardo, para o coração
regenerado, a lei é um deleite e um guia para a vida de gratidão.
Desfazendo
a Confusão: Distinções Essenciais na Lei de Deus
Para
compreender a continuidade da lei moral, é imperativo primeiro fazer distinções
claras. A teologia reformada historicamente divide a lei do Antigo Testamento
em três categorias: moral, cerimonial e civil (ou judicial) [5, 6]. A falha em
distinguir entre essas categorias é a raiz de grande parte da confusão.
A Lei
Cerimonial e Dietética: Cumprida e Revogada
As
leis cerimoniais (relacionadas ao templo, sacerdócio e sacrifícios) e as leis
dietéticas eram preceitos temporários com um propósito redentor-histórico
específico. Elas apontavam para a obra de Cristo e estabeleciam uma distinção
visível entre Israel e as nações pagãs. Com a vinda de Cristo, o véu do templo
se rasgou e o sacrifício perfeito foi oferecido uma vez por todas.
O
teólogo R. C. Sproul, ao comentar a visão de Pedro em Atos 10, esclarece
magnificamente este ponto. Deus declara todos os alimentos limpos, revogando
séculos de leis dietéticas. Sproul explica que isso não demonstra inconstância
no caráter de Deus. Pelo contrário, "Deus nunca revogaria a lei moral, os
Dez Mandamentos, pois ao fazê-lo, ele negaria o seu caráter". No entanto,
as leis dietéticas foram "adicionadas à aliança até a vinda de Cristo, o
qual derrubou o muro de separação". Sua revogação não foi um ato
arbitrário, mas o cumprimento de seu propósito: "demonstrar que os impuros
estavam sendo acolhidos e purificados por Cristo" [1]. Essas leis,
portanto, cumpriram sua função tipológica e foram graciosamente postas de lado.
A Lei
Moral: Eterna e Imutável
Diferentemente
das leis cerimoniais, a lei moral, sumariada nos Dez Mandamentos, não se baseia
em propósitos temporários, mas no próprio caráter eterno e santo de Deus.
"A lei moral de Deus foi abundantemente anunciada na Escritura [...] Ela
reflete seu caráter santo e seus propósitos para os seres humanos
criados", afirma J. I. Packer [6]. Por ser um reflexo de quem Deus é, essa
lei é, por natureza, imutável e perpétua. François Turretini, teólogo reformado
clássico, argumenta que a lei moral "deve corresponder à lei eterna e
arquetípica em Deus, visto que é sua cópia e sombra [...] Ora esta lei é
imutável e perpétua. Por isso a lei moral (seu éctipo) deve ser necessariamente
imutável" [19].
A
Distinção Singular dos Dez Mandamentos
Deus
mesmo fez questão de distinguir a lei moral das demais legislações mosaicas.
Arthur W. Pink aponta quatro maneiras pelas quais essa distinção foi marcada de
forma indelével [7]:
1. Foi
proclamada pela voz do próprio Deus em meio à majestade do Sinai,
enquanto as outras leis foram mediadas por Moisés.
2. Foi
escrita pelo dedo de Deus em tábuas de pedra, simbolizando sua
natureza duradoura e imperecível.
3. Foi a
única parte da lei colocada dentro da Arca da Aliança, o
lugar central da presença de Deus, significando que a lei moral é a base de
todo o relacionamento pactual de Deus com seu povo.
4. Inicia-se
com "Então falou Deus..." (Eˆxodo 20:1), usando o
título de Criador, indicando sua aplicabilidade universal a toda a humanidade,
e não apenas a Israel.
Essa
distinção demonstra que os Dez Mandamentos possuem uma autoridade e uma
permanência que transcendem a aliança mosaica.
Refutando
o Antinomianismo: Uma Análise Contextual
Aqueles
que advogam pela abolição da lei para o cristão frequentemente se apoiam em
versículos isolados, retirados de seu contexto. Uma exegese fiel, contudo,
revela que essas passagens não anulam a lei como regra de vida, mas redefinem a
nossa relação com ela no que tange à justificação e à condenação.
·
Romanos 6:14 — "Porque não estais
debaixo da lei, mas debaixo da graça." A. W. Pink, citando o
Bispo Moule e outros, argumenta que este versículo deve ser entendido dentro do
contexto judicial de Romanos, que trata da justificação. "O contraste não
é entre a lei de Moisés e o evangelho de Cristo, como duas economias ou dispensações,
mas sim entre a lei e a graça como os princípios essenciais de dois métodos de
justificação" [3]. Não estar "debaixo da lei" significa não
estar debaixo dela como um pacto de obras para obter salvação. João Calvino
reforça: "estamos muito enganados se pensarmos que a justiça que Deus
aprova em sua lei é abolida quando a lei é revogada [...] o que é dito ser
removido é a maldição" [3].
·
Romanos 7:4 — "Assim, meus irmãos,
também vós estais mortos para a lei." A morte para a lei é
uma morte para a sua maldição e penalidade, sofrida vicariamente em
Cristo. "Estar morto para a lei significa estar livre do poder da lei,
como tendo suportado sua penalidade e satisfeito suas demandas", explica
Robert Haldane [3]. Não significa que estamos livres de sua obrigação como
padrão de justiça.
·
Romanos 10:4 — "Porque o fim da lei é
Cristo para justiça de todo aquele que crê." A
palavra grega para "fim" (telos) significa primariamente
"meta", "objetivo" ou "culminação". Cristo é o
objetivo para o qual a lei sempre apontou. Ele é o fim da lei como um meio de
se obter justiça própria. A lei, em seu uso pedagógico, nos mostra nosso pecado
e nos conduz a Cristo, que é a nossa justiça [3].
·
Colossenses 2:14 — "havendo riscado a
cédula que era contra nós nas suas ordenanças." Pink,
comparando com Efésios 2, demonstra que a "cédula" (ou "escrito
de dívida") não é a lei moral em si, mas a sua condenação e,
especificamente, "a lei dos mandamentos, que consistia em ordenanças"
cerimoniais que criavam uma parede de separação entre judeus e gentios. Cristo
removeu essa barreira e a condenação, não o padrão moral de Deus [3].
Estabelecendo
a Lei: A Evidência Positiva de sua Perpetuidade
Longe
de anular a lei moral, o Novo Testamento a estabelece firmemente como o guia
para a vida cristã, obedecida não por medo, mas por amor e gratidão.
1. A
Declaração de Cristo (Mateus 5:17-19): A afirmação mais explícita
vem do próprio Senhor: "Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas:
não vim abrogar, mas cumprir [...] até que o céu e a terra passem, nem um jota
ou um til jamais passará da lei". Como D. Martyn Lloyd-Jones esclarece,
Cristo cumpriu a lei perfeitamente, pagou sua penalidade e revelou sua plena
profundidade espiritual. Ele a confirmou, não a aboliu [24].
2. A
Confirmação de Paulo (Romanos 3:31): Após defender a justificação
somente pela fé, Paulo antecipa a objeção: "Anulamos, pois, a lei pela
fé?". Sua resposta é enfática: "De maneira nenhuma, antes
estabelecemos a lei". O evangelho não anula a lei, mas provê o poder do
Espírito e a motivação do amor para que a "justiça da lei se cumprisse em
nós" (Romanos 8:4).
3. O
Deleite do Crente na Lei (Romanos 7:22): No meio de sua luta contra o
pecado remanescente, a experiência do cristão maduro, descrita por Paulo, é:
"Porque segundo o homem interior, tenho prazer na lei de Deus". Essa
é a marca da nova natureza: um amor pelo padrão santo de Deus.
4. A
Citação Direta da Lei (Romanos 13:8-10; Efésios 6:1-3): Os
apóstolos consistentemente citam os Dez Mandamentos como o padrão para a
conduta cristã. Paulo fundamenta a ética do amor no cumprimento dos mandamentos
("Não adulterarás, não matarás...") e exorta os filhos a honrarem
seus pais com base no quinto mandamento. O amor não substitui a lei; ele a
cumpre [4].
5. A Lei
no Coração (Hebreus 8:10): A promessa da Nova Aliança não é a
eliminação da lei, mas sua internalização: "porei as minhas leis no seu
entendimento, e em seu coração as escreverei". A lei deixa de ser um
código externo para se tornar um princípio de vida interior, gravado pelo
Espírito Santo.
A Lei
no Coração do Crente: O Padrão de Santidade na Vida da Graça
Para o
crente, a lei moral assume sua função mais nobre, o que os reformadores
chamaram de "terceiro uso da lei". Ela não é mais um acusador que
condena (uso teológico/pedagógico), mas um guia amigável para a santificação.
·
A Lei da Liberdade: Como
Michael Horton destaca, para o crente, a lei se torna "a lei da perfeita
liberdade" [9, 12]. O salmista exulta: "Percorrerei o caminho dos
teus mandamentos, porque tu libertaste o meu coração" (Salmo 119:32).
A verdadeira liberdade cristã não é a ausência de lei (anomia), mas a alegre
submissão à lei de Deus, impulsionada pela graça.
·
A Lei como Regra de Vida: A
obediência à lei não é para obter salvação, mas é a evidência da salvação. É a
maneira como o cristão expressa sua gratidão e amor ao Deus que o redimiu.
"Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me
ama", disse Jesus (Joa˜o 14:21). A graça não nos isenta da lei como
regra de vida; ela nos capacita a cumpri-la [24].
·
Andando como Cristo Andou: A
exortação final é "andar como ele andou" (1 Joa˜o 2:6). E
como Cristo andou? "Nascido sob a lei" (Gaˊlatas 4:4), Ele viveu
em perfeita e deleitosa obediência ao Pai. Conformar nossa conduta à lei de
Deus é seguir os passos de nosso Salvador.
Conclusão
A
doutrina da graça não anula a autoridade da lei moral de Deus; antes, a
estabelece em seu devido lugar. As leis cerimoniais e dietéticas, sombras da
realidade que viria, encontraram seu cumprimento em Cristo e cessaram. A lei
moral, no entanto, por ser um reflexo do caráter imutável de Deus, permanece
como o padrão eterno de justiça.
Para o
crente, justificado pela fé e liberto da maldição da lei, este santo padrão não
é mais um jugo de escravidão, mas a "lei real" (Tiago 2:8), a
"lei da liberdade" (Tiago 2:12). Escrita em seu coração pelo
Espírito Santo, a lei se torna o caminho no qual ele anda em gratidão, o
espelho que reflete a santidade de seu Pai e o mapa que o guia em amor a Deus e
ao próximo. Longe de ter passado, a lei moral de Deus está em plena validade,
não como um meio de justificação, mas como a doce e santa regra de vida para
aqueles que foram comprados pela graça.
Referências
Bibliográficas
[1]
Sproul, R. C. Estudos Bíblicos Expositivos em Atos. Trad. Rubens Thomaz
de Aquino. 1ª edição. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2017.
[2]
Sproul, R. C. Estudos Bíblicos Expositivos em Romanos. Trad. Heloisa
Cavallari, Márcio Santana Sobrinho, and Mary Lane. 1ª edição. Estudos Bíblicos
Expositivos. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2011.
[3]
Pink, A. W. O Cristão & Lei de Deus: Os Cristãos Devem Obedecer Aos Dez
Mandamentos? Org. William Teixeira. Trad. Rafael Almeida. 1ª Edição.
Francisco Morato, SP: O Estandarte de Cristo, 2021.
[4]
Packer, J. I. Teologia Concisa: Um Guia de Estudo Das Doutrinas Cristãs
Históricas. Trad. Rubens Castilho. 3ª edição. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2014.
[5]
Vernick, Leslie. Criando Um Forte Vínculo Entre Mãe E Filha: Para Além Da
Manipulação E Do Controle. Org. Tiago J. Santos Filho. Trad. Antonivan
Pereira. 1ª Edição. Aconselhamento. São José dos Campos, SP: Editora FIEL,
2020.
[6]
Woolsey, Andrew A. Unidade e Continuidade na Teologia da Aliança: Um Estudo
na Tradição Reformada da Assembleia de Westminster. Trad. Jonathan Hack. 1ª
edição. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2015.
[7]
Hodge, Charles. Teologia Sistemática. Trad. Valter Martins. 1ª edição.
São Paulo: Hagnos, 2001.
[8]
Turretini, François. Compêndio de Teologia Apologética. Org. Cláudio
Antônio Batista Marra. 1ª edição. Vol. 2. São Paulo, SP; Cambuci, SP: Editora
Cultura Cristã, 2010.
[9]
Horton, Michael. A Lei da Perfeita Liberdade: A Ética Bíblica a partir dos
Dez Mandamentos. Trad. Denise Meister. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
2000.
[10]
Bahnsen, Greg L. Homossexualismo: Uma Análise Bíblica. Trad. Odayr
Olivetti. 2ª edição. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2018.
[11]
Lloyd-Jones, D. Martyn. Estudos no Sermão do Monte. Org. Tiago J. Santos
Filho. Trad. João Bentes. Segunda Edição. São José dos Campos, SP: Editora
FIEL, 2017.
[12]
Chafer, Lewis Sperry. Teologia Sistemática. Org. Juan Carlos Martinez.
Trad. Heber Carlos de Campos. 3ª edição. Vol. 3. São Paulo: Hagnos, 2013.
[13]
Davis, John. "Lei". In Novo Dicionário da Bíblia. Trad. J. R.
Carvalho Braga. São Paulo: Hagnos, 2005.
[14]
Spurgeon, C. H. Justificação pela Fé. Trad. Luciana Guarino. 1ª Edição.
Francisco Morato, SP: O Estandarte de Cristo, 2021.
[15]
Frame, John M. A Doutrina da Vida Cristã. Trad. Jonathan Hack. 1ª
edição. Uma Teologia do Senhorio. São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013.
[16]
Bledsoe, David Allen. Igreja Regenerada: Uma Eclesiologia Bíblica, Histórica
e Contemporânea. Org. Vinicius Musselman Pimentel. Primeira edição. São
José dos Campos, SP: Editora FIEL, 2022.
[17]
Bavinck, Herman. Deus e a Criação. Org. John Bolt. Trad. Vagner Barbosa.
1ª edição. Vol. 2. Dogmática Reformada. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
2012.
[18]
Bavinck, Herman. Espírito Santo, Igreja e Nova Criação. Trad. Vagner
Barbosa. 1ª edição. Vol. 4. Dogmática Reformada. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2012.
[19]
Phillips, Richard D. Estudos Bíblicos Expositivos em Hebreus. Trad.
Deuber de Souza Calaça e Edmilson Francisco Ribeiro. 1ª edição. São Paulo:
Editora Cultura Cristã, 2018.
[20]
Tomlin, Graham, et al. Filipenses e Colossenses. Trad. Vagner Barbosa.
1ª edição. Comentário Bíblico da Reforma. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
2015.
[21]
Sproul, R. C. Como Posso Desenvolver uma Consciência Cristã? Org. Tiago
J. Santos Filho. Trad. Mauricio Fonseca dos Santos Jr. 1ª Edição. Vol. 14.
Questões Cruciais. São José dos Campos, SP: Editora FIEL, 2014.
[22]
Manser, Martin H. Guia Cristão de Leitura da Bíblia. Org. Daniele
Pereira et al. Trad. Lena Aranha. 1ª edição. Bangu, Rio de Janeiro: Casa
Publicadora das Assembleias de Deus, 2013.
Perguntas
para quem Acha que a Lei Moral de Deus Passou
Sobre
os Ensinamentos de Jesus Cristo
1. Em
Mateus 5:17-19, Jesus afirma categoricamente: "Não cuideis que vim
destruir a lei [...]: não vim abrogar, mas cumprir. [...] até que o céu e a
terra passem, nem um jota ou um til jamais passará da lei". Como podemos
conciliar a ideia de que a lei moral foi abolida com esta declaração tão
explícita e definitiva de Jesus sobre a sua perpetuidade?
2. Se a
lei moral foi abolida, por que Jesus, no Sermão do Monte, em vez de anulá-la,
aprofundou e intensificou suas exigências? Ele ensinou que a raiva no coração
equivale ao assassinato e o olhar cobiçoso ao adultério (Mateus 5:21-28). Isso
não parece mais uma confirmação do padrão da lei do que uma anulação?
3. Quando
Jesus resumiu toda a Lei em amar a Deus e amar ao próximo (Mateus 22:37-40),
Ele estava criando uma nova lei para substituir os Dez Mandamentos, ou estava
revelando o princípio fundamental que motiva e resume o cumprimento deles? O
amor verdadeiro não se expressa justamente em não matar, não
adulterar, não roubar, etc.?
4. A
Palavra nos exorta a "andar como Ele andou" (1 João 2:6). Sabendo que
Jesus viveu uma vida de perfeita obediência à lei de Seu Pai, sendo
"nascido sob a lei" (Gálatas 4:4), como podemos imitar a Cristo se
ignorarmos o próprio padrão de santidade que Ele perfeitamente cumpriu?
Sobre
os Ensinamentos dos Apóstolos
5. Após
uma longa defesa da justificação pela fé, o apóstolo Paulo pergunta em Romanos
3:31: "Anulamos, pois, a lei pela fé?". Ele mesmo responde: "De
maneira nenhuma, antes estabelecemos a lei". Se a fé abole a lei
moral, como Paulo pode dizer que a fé, na verdade, a estabelece? O que ele quis
dizer com isso?
6. Em
Romanos 6:14-15, Paulo diz que "não estamos debaixo da lei, mas debaixo da
graça" e imediatamente adverte: "Pecaremos porque não estamos debaixo
da lei? De modo nenhum!". Se a lei moral, que define o pecado, foi
removida, qual padrão Paulo está usando para nos advertir a não pecar?
7. Por
que os apóstolos, ao escreverem para as igrejas do Novo Testamento, compostas
majoritariamente por gentios, citam diretamente os Dez Mandamentos como guias
para a conduta cristã? (Ver Romanos 13:9 sobre adultério, assassinato, roubo;
Efésios 6:2 sobre honrar pai e mãe; Tiago 2:11 sobre adultério e assassinato).
8. Em 1
Coríntios 9:21, Paulo diz que, para com Deus, ele não está "sem lei",
mas está "debaixo da lei de Cristo". O que é a "lei de
Cristo" se não a lei moral de Deus agora mediada por nosso Redentor e
obedecida por um coração grato e regenerado?
Sobre
a Natureza de Deus e da Lei
9. Se a
lei moral é um reflexo do caráter santo, justo e imutável de Deus, como poderia
Deus abolir ou revogar essa lei? Isso não implicaria que o próprio caráter de
Deus mudou ou que Ele passou a ser indiferente ao roubo, à mentira, à idolatria
e ao adultério?
10.
A promessa da Nova Aliança, citada em Hebreus
8:10, é que Deus colocaria Suas leis na mente e as escreveria no coração
de Seu povo. Por que Deus prometeu internalizar algo que Ele mesmo pretendia
abolir? Isso não sugere que a nossa relação com a lei mudaria (de externa para
interna), em vez da lei em si ser eliminada?
11.
Qual o propósito de Deus ter feito uma
distinção tão solene na entrega dos Dez Mandamentos — falando audivelmente do
Sinai, escrevendo com Seu próprio dedo em pedra e ordenando que fossem
guardados na Arca da Aliança — se eles tivessem a mesma natureza temporária das
leis cerimoniais?
Sobre
a Natureza do Pecado, da Graça e do Amor
12.
A Bíblia define pecado como "a
transgressão da lei" (1 João 3:4). Se a lei moral foi abolida, como
podemos definir o que é pecado hoje? Se não há lei, como pode haver
transgressão?
13.
A Escritura diz que "o amor é o
cumprimento da lei" (Romanos 13:10). Você interpreta isso como o amor
sendo um substituto para a lei, ou como o amor sendo o motivo e a
força que nos leva a viver de acordo com os preceitos da lei? O amor ao
próximo não é a razão pela qual não devemos roubá-lo ou mentir para ele?
14.
Se a graça nos liberta da obrigação moral de
obedecer aos mandamentos de Deus, como podemos evitar a conclusão de que a
graça se torna uma licença para a imoralidade, uma ideia que Paulo combateu com
veemência em Romanos 6?
Perguntas
para Reflexão Prática
15.
Você acredita que um cristão hoje tem a
liberdade de adorar ídolos, blasfemar o nome de Deus, desonrar seus pais,
assassinar, cometer adultério, roubar ou mentir? Se a sua resposta é
"não", em qual autoridade divina e imutável você baseia essa proibição,
se não na lei moral de Deus?
16.
Sem os princípios dos Dez Mandamentos, como
você ensinaria a uma criança, ou a um novo convertido, a diferença objetiva
entre o bem e o mal, o certo e o errado, de uma forma que não seja baseada
apenas em preferências culturais ou sentimentos pessoais?
Sobre
a Lei e o Espírito Santo
17.
Se a lei moral é algo oposto à vida no
Espírito, por que o Salmo 119, a mais longa e apaixonada celebração da beleza e
bondade da lei de Deus, é um dos capítulos mais espiritualmente ricos de toda a
Escritura? O Espírito que inspirou o salmista a se deleitar na lei é diferente
do Espírito que habita em nós hoje?
18.
O apóstolo Paulo afirma que "a lei é
espiritual" (Romanos 7:14). E, ao descrever o fruto do Espírito (amor,
alegria, paz, etc.), ele conclui dizendo que "contra estas coisas não há
lei" (Gálatas 5:23). Isso não indica que o Espírito produz em nós um
caráter que está em perfeita harmonia com a intenção da lei, em vez de
um caráter que a considera irrelevante?
19.
Frequentemente se diz: "O Espírito me
guia, não preciso de uma lei externa". Como essa visão se harmoniza com o
fato de que o próprio Espírito Santo é o autor das Escrituras, incluindo as
passagens que citam e aplicam a lei moral à vida do crente? O Espírito se
contradiria, inspirando a lei na Bíblia e depois nos guiando para longe dela em
nossa vida pessoal?
20.
A Palavra ensina que o Espírito nos convence do
pecado (João 16:8). Quando o Espírito Santo trabalha em sua consciência,
mostrando que uma atitude sua foi egoísta, uma palavra foi destrutiva ou um
pensamento foi impuro, Ele não está, na prática, aplicando o padrão santo da
lei de Deus ao seu coração para revelar sua necessidade de Cristo e do
arrependimento?
Sobre
a Unidade das Escrituras e a História da Salvação
21.
Sabemos que os santos do Antigo Testamento,
como Abraão, Davi e Daniel, foram salvos pela graça mediante a fé. Para eles, a
lei de Deus não era um meio de salvação, mas um guia para uma vida piedosa.
Davi, um homem justificado pela fé, exclamou: "Oh! quanto amo a tua
lei!". Se a lei era uma fonte de deleite espiritual para um crente
justificado antes da cruz, por que ela se tornaria algo negativo ou
obsoleto para um crente justificado depois da cruz?
22.
Se a lei moral foi um código temporário
destinado apenas à nação de Israel, por que seus princípios são aplicados a
todas as nações e indivíduos desde o início da criação? Por que Caim foi
julgado por assassinato e a geração de Noé por sua maldade, muito antes de a
lei ser entregue no Sinai? Isso não aponta para uma lei moral universal e
eterna, da qual os Dez Mandamentos são a mais clara expressão escrita?
23.
A Bíblia se revela como a Palavra de um único
Deus imutável. Se Deus estabeleceu um padrão moral fundamental (expresso nos
Dez Mandamentos) como um reflexo de Sua santidade e depois o
"aboliu", isso não criaria uma imagem de um Deus que muda seus
padrões morais fundamentais? Como podemos confiar na Sua Palavra se a própria
base do que Lhe agrada é instável?
Sobre
as Consequências Lógicas e a Vida da Igreja
24.
Se não existe uma lei moral objetiva e
transcendente que obrigue a todos os cristãos, como a Igreja pode exercer a
disciplina eclesiástica de forma justa e consistente? Com base em que
autoridade a igreja poderia afirmar que a conduta de um membro é pecaminosa e
requer arrependimento (conforme 1 Coríntios 5)? Sem a lei, o que impede que a
disciplina seja baseada apenas na opinião da maioria?
25.
Em debates éticos cruciais (como bioética,
ética sexual, justiça social), se a lei moral de Deus não for a nossa âncora, o
que impede a Igreja de simplesmente ser levada pelos ventos da moralidade da
cultura secular, que está em constante mudança? Onde encontramos nosso
"norte" moral?
26.
A palavra "justiça" (dikaiosynē)
é central em todo o Novo Testamento. O que significa "ter fome e sede de
justiça" (Mateus 5:6) ou ser um "servo da justiça" (Romanos
6:18) se a lei que define a justiça de Deus foi removida? Justiça se torna
apenas um conceito abstrato e subjetivo?
Sobre
Julgamento, Obras e Recompensa do Crente
27.
A Bíblia ensina que os crentes comparecerão
perante o Tribunal de Cristo "para que cada um receba segundo o bem ou o
mal que tiver feito por meio do corpo" (2 Coríntios 5:10). Se não há uma
lei moral para servir de padrão, como as nossas obras serão julgadas como
"boas" ou "más"? Qual será o critério para este julgamento?
28.
Jesus promete que aquele que observar e ensinar
Seus mandamentos "será considerado grande no reino dos céus" (Mateus
5:19). Como pode haver uma recompensa por observar mandamentos que não estão
mais em vigor? Essa promessa não perde o sentido se a lei foi abolida?
29.
No livro do Apocalipse, a perseverança dos
santos é descrita como a daqueles que "guardam os mandamentos de Deus e
têm a fé em Jesus" (Apocalipse 14:12). Por que a observância dos
mandamentos seria uma marca distintiva do povo de Deus nos últimos dias, se
essa obrigação tivesse cessado séculos antes na cruz?
30.
Considerando que a vida de Cristo é o nosso
modelo supremo de conduta, e que Ele não apenas guardou a lei perfeitamente,
mas declarou que veio para 'cumpri-la' (Mateus 5:17), como a nossa imitação
d'Ele poderia incluir a anulação do próprio padrão moral que Ele personificou e
honrou? A nossa maneira de seguir a Cristo é vivendo de forma contrária ao Seu
exemplo nesse aspecto?
31.
A Bíblia afirma que a lei moral de Deus,
resumida nos Dez Mandamentos, é 'santa, justa e boa' (Romanos 7:12). Se este
padrão era a 'boa' e santa vontade de Deus para o Seu povo redimido na Antiga
Aliança, que mudança teria ocorrido no caráter de Deus ou na natureza
da santidade para que este mesmo padrão deixasse de ser 'bom' e aplicável
ao Seu povo redimido na Nova Aliança?
32.
Geralmente,
revogamos uma lei por um de três motivos: ela se mostrou falha ou má, seu
propósito foi totalmente cumprido (como uma lei para construir uma ponte é
revogada após a construção), ou o legislador mudou de ideia sobre o que é
certo.
O Novo Testamento
afirma que a lei moral é 'santa, justa e boa' (Romanos 7:12), então ela não era
falha. O próprio Legislador, Deus, é imutável em Seu caráter e santidade, então
Ele não 'mudou de ideia'.
Sendo assim, qual seria
a justificativa bíblica para revogar Seus mandamentos morais? Como o mandamento
'Não furtarás' ou 'Não cometerás adultério' pode ser considerado 'cumprido' a
ponto de perder sua validade como o padrão de conduta para aqueles que buscam
honrar a Deus?
0 Comentários