A Vindicacão e as Primícias da Nova Criação
A ressurreição corporal de Jesus Cristo
é o fundamento da fé cristã, um evento histórico no espaço-tempo que não
apenas O vindica como Filho de Deus e Messias, mas também estabelece o protótipo
e a garantia da ressurreição futura de todos os crentes. O evento não
foi um mero retorno à vida mortal nem a sobrevivência etérea de uma influência,
mas sim a manifestação de um corpo real, físico e, contudo, glorificado
e transformado.
O Que é o Corpo Glorificado (σῶμα
πνευματικός)?
O corpo glorificado (do grego, sōma
pneumatikon, “corpo espiritual”, conforme 1 Coríntios 15.44) é o mesmo
corpo que foi sepultado, mas elevado a um novo plano de existência,
livre das limitações impostas pela Queda. A teologia reformada, ao defender a
ressurreição física de Jesus, rejeita a ideia de um corpo imaterial ou
fantasmagórico.
O teólogo reformado Simon Kistemaker
explica que, ao usar o adjetivo “espiritual” (pneumatikon), Paulo não
sugere um corpo etéreo, mas sim um corpo que é completamente cheio do
Espírito e governado pelo Espírito [6, 7, 20]. É um corpo que ascende a um nível
supernatural, mantendo a materialidade essencial, mas com novas
propriedades [6].
A natureza desse corpo, modelado pelo de
Cristo, é caracterizada pelos seguintes contrastes notáveis com o corpo atual,
conforme ensinado por Paulo em 1 Coríntios 15.42-44:
|
Corpo Terreno (Semeado) |
Corpo Glorificado (Ressuscitado) |
|
Em Corrupção (sujeito à
decomposição e morte) |
Em Incorrupção (imortalidade,
livre de doença e morte) |
|
Em Desonra (humilhação e
fragilidade) |
Em Glória (radiante e
transformado) |
|
Em Fraqueza (sujeito ao cansaço
e limitação) |
Em Poder (capacidade e vigor
ilimitados) |
|
Corpo Natural (psychikon) |
Corpo Espiritual (pneumatikon) |
O corpo glorificado de Jesus demonstrou
essa combinação extraordinária de continuidade e descontinuidade [13,
19]:
·
Continuidade: Era o mesmo Jesus (Lucas 24.39:
"Vede as minhas mãos e os meus pés, que sou eu mesmo; apalpai-me e
verificai, porque um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu
tenho"). Ele podia ser tocado, tinha carne e ossos, e até comeu (Lucas
24.41-43) [1, 15]. As marcas dos pregos estavam em Suas mãos e pés (João
20.27), ligando-O inequivocamente ao Jesus que sofreu e morreu [14].
·
Descontinuidade: Sua forma não era imediatamente
reconhecível (Lucas 24.16; João 20.14) e Ele possuía a capacidade de aparecer e
desaparecer misteriosamente, entrando em salas com portas trancadas (Lucas
24.36; João 20.19) [1]. O reformador Charles Hodge observa que, embora o
corpo de Cristo retivesse sua identidade e materialidade, ele havia sofrido modificação
notável, passando para um estado glorioso, incorruptível, imortal e
espiritual [15].
A Ressurreição como Vindicacão e Modelo
Reformado
A doutrina da ressurreição em corpo
glorificado é central para a teologia reformada por sua dupla função: vindicacão
do Messias e garantia da esperança do crente.
1. A Vindicacão de Jesus Cristo
A ressurreição é o ato do Pai que declara
a justiça e a filiação divina de Jesus (Romanos 1.4) [3]. O evangelista D.
A. Carson enfatiza que a ressurreição é a prova de que o sacrifício de
Cristo na cruz agradou a Deus: "É uma prova positiva de que, quando Jesus
disse, ao morrer: 'Está consumado', Deus concordou" [12]. Ao levantar-se,
Ele demonstrou que a morte já não tinha domínio sobre Ele, como ensina Paulo:
"Sabedores de que, havendo Cristo ressuscitado dentre os mortos, já não
morre; a morte já não tem domínio sobre ele" (Romanos 6.9) [24].
2. As Primícias e o Modelo para a Igreja
Cristo, com Seu corpo glorificado, é
chamado de "as primícias dos que dormem" (1 Coríntios 15.20),
uma imagem do Antigo Testamento que representa a primeira parte da colheita que
garante a colheita completa (a igreja) [14].
O corpo glorificado de Jesus é o modelo
para os corpos futuros dos crentes. A esperança máxima não é uma existência
etérea, mas a ressurreição corporal para um corpo como o de Cristo. J.
C. Ryle nos exorta a buscar consolo nesse pensamento: "Jesus
ressuscitou com um corpo renovado, mas com um corpo — real, verdadeiro e
material; da mesma forma, os crentes terão um corpo glorioso e serão como ele,
que é o Cabeça de todos. 'Quando ele se manifestar, seremos semelhantes a
ele' (1 João 3.2)" [2].
A teologia reformada, por meio de Wolfgang
Musculus, ressalta que a transformação do nosso corpo de humilhação não é
uma mudança de essência, mas de condição: "nossa condição
humilhante, fraca, mortal e corrompida será transformada na condição do corpo
glorificado de Cristo" [17]. Donald Macleod resume a glória de
Cristo dizendo que Ele foi "super-exaltado" (Filipenses 2.9), e por
isso Deus também "super-exaltou" Seu corpo [11].
A ressurreição de Jesus, seguida por Sua
ascensão (Atos 1.9-11), marca Sua entrada permanente no estado de glória, onde
Ele está assentado à destra de Deus (Atos 2.34; Hebreus 8.1) em Seu corpo
glorificado [1, 4, 15]. Como Cabeça de Seu povo, Seu corpo no céu é a garantia
de que Seus seguidores também serão "como Jesus e estaremos com ele
eternamente" [7].
Referências Bibliográficas Citadas e
Adicionais
1.
Bavinck,
Herman. O Pecado e a Salvação em Cristo. Vol. 3. São Paulo: Editora
Cultura Cristã, 2012.
2.
Ryle,
J. C. Meditações no Evangelho de Mateus. São José dos Campos, SP:
Editora FIEL, 2018.
3.
Packer,
J. I. Teologia Concisa: Um Guia de Estudo das Doutrinas Cristãs Históricas.
São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2014.
4.
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J. I. Teologia Concisa: Um Guia de Estudo das Doutrinas Cristãs Históricas.
São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2014.
5.
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6.
Kistemaker,
Simon. 1 Coríntios. São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2014.
7.
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8.
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Simon. 1 Coríntios. São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2014.
9.
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Charles Caldwell. Teologia Básica: Um Guia Sistemático Popular para Entender
a Verdade Bíblica. São Paulo: Mundo Cristão, 2012.
10. Kistemaker, Simon. 1 Coríntios.
São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2014.
11. Macleod, Donald. A Pessoa de Cristo.
Cambuci; São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2003.
12. Santos Filho, Tiago J. (org.). Devocional
do Catecismo Nova Cidade: A Verdade de Deus para Nossos Corações e Mentes.
São José dos Campos, SP: Editora FIEL, 2017.
13. Stott, John. O Evangelho: Uma
Mensagem que Transforma a Vida. Viçosa, MG: Ultimato, 2021.
14. Jones, Mark. O Conhecimento de Cristo.
Brasília, DF: Editora Monergismo, 2018.
15. Hodge, Charles. Teologia Sistemática.
São Paulo: Hagnos, 2001.
16. Presley, Stephen. “O Corpo Glorificado”.
In Sumário de Teologia Lexham. Bellingham, WA: Lexham Press, 2018.
17. Tomlin, Graham et al. Filipenses e
Colossenses. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2015.
18. Hoekema, Anthony A. A Bíblia e o
Futuro. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2012.
19. Stott, John. A Bíblia Toda, o Ano
Todo: Meditações Diárias de Gênesis a Apocalipse. Viçosa, MG: Ultimato,
2021.
20. Kistemaker, Simon. 1 Coríntios.
São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2014.
21. Sproul, R. C. Somos Todos Teólogos:
Uma Introdução à Teologia Sistemática. São José dos Campos, SP: Editora
FIEL, 2017.
22. Sproul, R. C. Somos Todos Teólogos:
Uma Introdução à Teologia Sistemática. São José dos Campos, SP: Editora
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23. Sproul, R. C. A Glória de Cristo:
Conheça a Majestade do Senhor dos Senhores. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2004.
24. Kistemaker, Simon. Atos. Vol. 1.
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25. Sproul, R. C. Somos Todos Teólogos:
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26. Osborne, Grant R. Evangelho de Lucas.
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27. Davis, John. “Ressurreição de Cristo”.
In Novo Dicionário da Bíblia. São Paulo: Hagnos, 2005.

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